sábado, 29 de agosto de 2009

Centricidade do Cliente - Perspectiva da Banca


O cliente é hoje visto como um dos pricipais activos dos bancos, pelo que lhes merece o maior respeito e atenção. A estratégia no sector bancário é multifacetada, no entanto de seguida dar-se-á o enfoque fundamentalmente a quatro pilares que orientam a actividade comercial dos bancos do ponto de vista de gestão de clientes: captação, fidelização, retenção e reactivação. Os conceitos podem ser fáceis de compreender, mas a sua operacionalização obriga os bancos a um constante e incessante desenvolvimento de acções de dinamização comercial no sentido de manter ou aumentar o nível concorrencial. A captação de clientes é fundamental para os bancos para irem rejuvenescendo a sua base de clientes e para potenciarem a fidelização dos mesmos numa lógica de customer lifetime value, ou seja, criar valor para o banco na relação comercial ao longo do tempo. Durante vários anos houve a noção de que apenas a captação de clientes seria geradora de lucros para a empresa. Todavia, presentemente a procura de novos clientes é sinónimo de custos elevados, que podem não conseguir ser amortizados apenas pela venda de produtos e serviços aos mesmos. Cada vez é mais difícil captar um cliente bancário. Por conseguinte, o esforço de captação que os bancos têm apresentado nos últimos anos tem vindo a aumentar, sendo obrigados a lançar campanhas de marketing extremamente arrojadas e convidativas e muitas vezes numa lógica de agregado familiar, isto é, oferecer benefícios cruzados entre, por exemplo, pais e filhos. Hoje em dia, oferecem-se GPS, DVD’s portáteis, máquinas de café, entre outros brindes. Actualmente existe mesmo um banco espanhol que em vez de pagar juros credores num depósito a prazo (sob determinados requisitos), oferece um automóvel (FinObserver, 2008). Estas acções de oferta eram simplesmente impensáveis há uns anos atrás na banca. Mas a evolução do quadro competitivo deste sector tem aumentado os horizontes de criatividade dos bancos.

Pode-se ainda referir mais dois excelentes meios de captação de clientes: os aclamados programas member-get-member, onde tanto o cliente angariador como o cliente angariado recebem brindes ou condições preferenciais na contratação de produtos ou serviços, e ainda os protocolos comerciais, que permitem aos bancos angariar de uma só vez dezenas, centenas ou mesmo milhares de clientes. O seu modelo de funcionamento é simples e tentador. Apresenta-se o seguinte exemplo: o banco capta um cliente “empresa” e concede-lhe benefícios a vários níveis, com especial enfoque para as bonificações nas taxas de juro em operações de crédito. Em troca, a empresa transfere as contas-ordenado dos seus colaboradores para o banco, concedendo-lhes também condições preferenciais a vários níveis, designadamente reduções de spreads no crédito pessoal e crédito habitação, anuidades gratuitas nos cartões de débito e crédito, domiciliação gratuita de despesas periódicas e acesso gratuito a canais electrónicos. Como se infere por este exemplo, as vantagens são recíprocas: o banco capta vários clientes e tem possibilidade de iniciar um processo de fidelização com todos eles (leia-se, vender produtos e serviços), a empresa garante condições excepcionais em produtos que lhe interessa (recorrentemente ao nível do crédito) e os colaboradores beneficiam de vantagens exclusivas (por via do protocolo) na aquisição de produtos e serviços de retalho.

A fidelização dos clientes afigura-se, assim, como uma premissa básica para a estratégia comercial dos bancos. A velha máxima de que reter um cliente custa apenas 20% do custo de captação de um novo cliente parece ter alguma razão para existir. Veja-se o exemplo da banca: para captar um cliente poder-se-á eventualmente ser necessário ter um plano de meios para promover um determinado produto ou serviço; será necessário um esforço comercial na agência para o persuadir o cliente; será necessário o envio de mailings numa óptica de free prize inside [Seth Godin, 2004], isto é, hoje em dia gastar elevados montantes em publicidade poderá não ser tão eficaz como oferecer um “brinde” ao cliente no momento de venda (algo que efectivamente lhe possa ser útil e ter um elevado valor percebido); será certamente necessária uma abordagem mais contínua e intensa numa fase inicial de actividade do cliente, seja pela via pessoal ou por outros canais electrónicos. A fidelização não engloba nem obriga, naturalmente, todas estas medidas de dinamização comercial.

Hoje em dia a maioria dos bancos nacionais assume um posicionamento de banca universal, isto é, para além de comercializarem produtos de retalho (contas de depósitos à ordem, poupanças, crédito pessoal, crédito imobiliário, entre outros), disponibilizam ainda na sua proposta de valor produtos seguradores, de investimento e de crédito especializado (como o leasing e renting). Na maioria dos casos, este tipo de produtos é gerido por outras empresas associadas do banco principal e têm a grande vantagem de permitirem potenciar as acções de cross-selling dirigidas a clientes e complementar uma proposta global que responde em simultâneo a várias necessidades financeiras. Em paralelo, os esquemas de cross-subsidising (atribuição de bonificações na taxa de juro em função de outros produtos subscritos/detidos) estão cada vez mais em voga nas instituições bancárias. Há mesmo bancos que adoptam esquemas de subsidiação cruzada extremamente exigentes, “obrigando” o cliente a contratar seis ou sete produtos caso pretenda beneficiar da taxa mínima num produto de crédito. Algumas entidades supervisoras têm vindo a colocar em causa este tipo de esquemas, no entanto a verdade é que são um excelente meio para aumentar a fidelização dos clientes.

Os bancos actualmente suportam-se em robustas plataformas de customer relationship management (CRM), que lhes permite ter uma visão global da via e potencial de cada cliente (Durkin, 2003).

As acções de fidelização conseguem ser bem sucedidas quando o cliente encontra-se satisfeito com a sua instituição financeira. Um cliente altamente fidelizado ao banco está disposto a pagar mais por um determinado produto ou serviço, porque sabe que tem a garantia de um excelente serviço. É nesta base que os bancos têm cada vez mais apostado em estratégias de pricing inteligente, de acordo com o segmento a que o cliente pertence, o seu nível de envolvimento comercial, o seu perfil de risco e os produtos que escolhe. O sucesso das acções de fidelização permite também aumentar o share-of-wallet do cliente, isto é, o número médio de produtos por ele detido e, consequentemente, a rentabilidade para o banco. Um cliente que não dá qualquer rentabilidade para o banco (muitas vezes até incorre em prejuízos), não é obviamente considerado um cliente importante ou prioritário. Por esta razão, as acções de fidelização (maioritariamente sob a forma de campanhas de marketing relacional) têm sempre em conta o nível de rentabilidade dos clientes. E rentabilidade é sempre a palavra de ordem neste tipo de acções.

A retenção é outro dos pilares fundamentais na gestão dos clientes. Actualmente a fidelidade dos clientes às instituições financeiras é cada vez mais um valor ameaçado. Com uma oferta cada vez mais alargada e uma elevada competitividade entre os players do mercado, é natural que exista uma tendência para a redução das relações duradouras, de vários anos, que os clientes têm com os seus bancos. O estímulo à mudança é cada vez maior e o conservadorismo tende a diminuir significativamente. Bastará recordar que há uns anos atrás transferir um crédito habitação de um banco para outro implicava elevados switching costs para os clientes. Hoje em dia, os bancos asseguram a cobertura de todos os custos de transferência, facilitando a mudança de um banco para o outro. Estas situações obrigam os bancos a reflectir sobre a necessidade de diminuirem o churn effect no seio dos seus clientes, isto é, sobre a sua taxa de abandono. A maioria dos bancos tem actualmente sistemas de informação de gestão que permitem quantificar claramente os clientes que indiciam sinais de deserção do banco, através de um sistema de alertas. Este sistema é fulcral para o banco poder identificar quais são os seus melhores clientes, mais rentáveis, de forma a poderem lançar campanhas específicas de retenção. É natural que com esta crescente competitividade dos bancos, o maior beneficiado acabe sempre por ser o cliente, que aumenta o seu poder negocial.

Um outro dilema que os bancos se deparam actualmente é o de terem na sua base de clientes milhares em situação de inactividade, isto é, clientes que por alguma razão deixaram de trabalhar com o banco. Nestas situações, para poderem reactivar os seus clientes, os bancos optam quase sempre por lançar campanhas de win-back, que apresentam características mais apelativas do que uma campanha de fidelização. É fácil de compreender por que razão estas campanhas obrigam na maioria das vezes a um maior custo de marketing, principalmente quando há clientes que apresentam sinais insatisfação perante o banco. Naturalmente este tem como objectivo estratégico activar os clientes inactivos e torná-los rentáveis, uns naturalmente com mais potencial que outros, ao mesmo tempo que procura angariar novos clientes.

2 comentários:

Leonardo disse...

Muito bem :)

Em relação aos problemas, a descredibilização da banca não será outro?

Com os casos sobejamente conhecidos em que clientes perderam (literalmente) dinheiro devido à má gestão, talvez o cliente possa estar algo desinteressado... ou isso o possa inibir inconscientemente de correr riscos.

Como se "voltam a ganhar" esses clientes?

Transmitir confiança no meio do caos não é fácil com certeza.

E a receptividade também não é a mesma derivado da vasta oferta e do maior conhecimento de causa.

Abraço!

Dylan disse...

A banca é o motor da economia nacional. Aliás, de qualquer economia. Se o Estado e os clientes não confiarem nos bancos, quem confiará?
O sub-prime frustrou os níveis de confiança dos stakeholders, reduziu os níveis de liquidez no mercado monetário, hipotecou o sonho de muita gente adquirir a casa e o carro desejado por via do maior controlo na concessão de crédito por parte dos bancos. Os países mais desenvolvidos entraram em recessão. Deu-se assim início a um ciclo económico negativo jamais visto por pessoas da nossa geração.

Mas o ciclo começou já a inverter a tendência...devagar, devagarinho, mas as economias estão já com níveis de confiança bem mais elevados dos que tinham há uns tempos atrás. A restrição na concessão ao crédito já não é tão...restritiva. É verdade que muitos clientes perderam dinheiro, mas como dizes, e bem, foi devido à má gestão. São casos residuais e que não podem ser generalizados. Como se voltam a ganhar esses clientes? Pois, não é fácil... o BPN já perdeu mais de 800 milhões em depósitos depois de se ter descoberto as "artistices" que o Sr. Oliveira e Costa andava a fazer. A confiança pode ser retomada, mas vai ser difícil porque o caso foi demasiadamente mediatizado, por motivos evidentes.

Muito havia a dizer a este respeito, mas o que importa mesmo é que os bancos não vivem sem os seus clientes e os clientes não vivem... sem bancos! Ou a confiança é recíproca, ou é a economia que passa a estar em maus lençóis...

Um abraço!
DR